terça-feira, 22 de maio de 2012

AS CRIANÇAS SANJOANENSES



Crianças Burgelly, Lolô, Alice, Olga e Elias, vestidos para
festa de São João.  
AS CRIANÇAS SANJOANENSES


A coisa mais deliciosa que existe é ser criança em São João da Barra. Me lembro bem de minha infância, em que morava numa praça imensa, e lá, podia deixar minha mente me levar para o infinito.
De primeiro havia um parquinho na praça, mas delicioso era quando chovia no verão e quando parava a chuva, havia no meio da praça uma lagoa para delicia das crianças.
Na casa de Tia Nilse, onde eram muitos os filhos e primos, as brincadeiras giravam sempre em torno de bola e pipa, sendo meu primo Franklim o “espert” do assunto. Lá eles tinham até um corisco que ficava na garagem, laboratório de preparo do cerol.
Hesio Simões manda para vovó
Cocota, com muitos beijos.1921. 
As brincadeiras das crianças Almeida eram sempre festivas, pois eles eram muitos. Os cozinhados de Rita de Toninha! Que saudades! As meninas todas brincando de cozinhar. E os batizados das bonecas de Nathercia, num altar de Dedê Luiza.
No quintal de Ermelita Rolim, brincávamos de Circo, e junto com Marcelo e Ralph Peixoto, de fazer carros alegóricos mirins. Uma vez seu Delinho, pai deles, fez na fábrica, uma bomba manual que bombeava água numa cachoeira.
Pião, ioiô, baleba, ou bola de gude eram as brincadeiras da maioria.
Lá em casa eram quatro crianças com pequenas diferenças de idade, mas mamãe nos presenteava com coisas fantásticas, como uma vez que ela nos deu um caixa de apetrechos para produzir jornais. Os textos de teatro e os discos de Walt Disney.
Outras brincadeiras infantis, que animavam as férias e as noites da criançada eram os piques esconde, com as crianças correndo pela cidade inteira.
Os primos de fora, quando vinham passar as férias e tinham que retornar, quase morriam.


Uma pagina sobre pipas no
livro de brincadeiras infantis.



AS BRINCADEIRAS

Um livro dedicado aos brinquedos
infantis sanjoanenses.
Pela Mestra Anna Augusta.
A folclorista Ana Augusta Rodrigues, quando morou nessa terra relacionou em livro várias brincadeiras que viu, dentre elas:

Brincadeiras de roda,
Versos,
Amarelinha,
Aposta de mão,
Atiradeira de bambu,
Passar anel,
Eu na praia de atafona e molhando as plantas
do jardim da casa de mamãe.
Brinquedos na corda,
Foguinho,
Bão! Ba-la-lão,
Batatinha Frita,
Balebas ou gude,
Currupicho,
Belilisco,
Bolhas de sabão,
Bento que bento é o frade,
Chicotinho queimado,
Cabra cega,
Céu ou Inferno,
Currupio,
Casinha de Coelho,
Caveira de Mamão,
Cama de Gato,
Carrinhos de Mão e outros,
João Bobo,
Língua do “I”, “Japonês”,
Pai João,
Três Marias,
Uni- Du-Ni-Te,
Assovios vários,
Folhinha Verde,


BRINCADEIRAS DE RODA


CARANGUEJO NÃO É PEIXE

Assim se apresentava por volta de 1900, em São João da Barra.
Por fora da roda, munido de uma bengala, um menino era o “caranguejo”, e entrava para fazer sua visita. Ao “quebrar sua puã”, fingia cair e retirava-se todo pendido para o lado, imitando comicamente o animal assim acidentado; de novo por fora, acompanhava a roda até o fim!
Enquanto cantavam:

Agenor Lobato com seus brinquedos.
Wlamir Lobato com carrinho de mão.
Wlamir e Estelinha na frente de casa.
Caranguejo era dotô,
Foi visitá sua irmã,
Na subida da escada,
Lá se foi sua puã!

Ora pé, pé, pé,
Ora palma, palma, palma,
Ora roda, roda, roda,
Caranguejo peixe é!

Caranguejo não é peixe,
Caranguejo peixe é,
Caranguejo só é peixe,
Na Enchente da Maré!

Eu, Estella e Wlamir na praça de S. Benedito.
Wlamir brincando na praça.
Wlamir no parque de São Benedito.
As crianças no segundo quartel
do século XX, começam a sorrir
nas fotografias. A alegria e o sorriso
já não são mais pecados.
Estella no balancinho.
Eu, Wlamir e Estella no portão.

Vovô e Vovó com a prole.
Vovô com os netos no parque.
Marcelo, eu e wlamir.
UMA, DUAS, ANGULINHA

As crianças sentam-se, em duas filas, de frente uma para a outra. Esticam as pernas, de modo a encostar as solas dos pés. Embora seja esta a posição tradicional, usam igualmente, sentar-se em circulo.
O “mestre” senta-se também no meio das outras. Estendendo o braço, vai beliscando de leve e “contando” os pés, como num pique, ao passo que vai dizendo:
- Uma, duas, angulinhas!
Bota o pé na pampulhinha.
O rapaz que o jogo faz!
Faz o jogo do capão...

Conta bem que vinte são,
Vai dizê a Mané João,
Que recolha esta perninha,
Da conchinha do mamão...
A criança, em cujo pé termina a contagem, retira-o, encolhendo a perna.
Repete-se a contagem com a musica e assim por diante...
O ultimo pé que fica é o “Pé de Pilão” que recebe um tratamento especial, com as crianças cantando enquanto seguram aquele pé:
- Pé de Pilão!
Carne seca com feijão,
E rabinho de porco,
É muito bão...

Vestir as crianças de marinheiros.
um habito antigo no Brasil.
O menino Cruz e sua irmã Marianinha,
primos de vovô, em trajes de marinheiro.


Ser criança em São João da Barra
é ter a felicidade de ser livre.
Norméa Lobato em seu carrinho de latão.
1934.



A FESTA DO DIVINO ESPIRITO SANTO


Ser escolhido, por sorteio, para ser coroado e sagrado pela igreja, para no futuro ano empunhar o cetro e ocupar o trono duma das Divinas Pessoas cá na terra, segundo Fernando Jose Martins, traz ao festeiro tal ou qual prestígio e cordiais atenção do povo ainda nos dias de hoje. Falava isso em 1868, data da publicação de seu livro.
Porem é certo que esta festa, remonta há muito mais tempo.  Segundo Martins a Festa do Divino Espírito Santo, uma das mais antigas e concorridas de nosso calendário, surgiu em 1775, quando 4 açorianos, cá da Vila , instituíram a festa, de acordo com o vigário e mediante certos estatutos e cerimonial.
Um evento religioso, carregado de ritos profanos; teve como primeiro Imperador, pois assim se chama o festeiros, Manuel Antunes Moreira, filho do Manposteiro Domingos Moreira.
Longeva festa, foi interrompida pelo vigário em 1969, ano em que, tia Malvina Zaguine iria fazer a festa e, Eu e Estella seriamos o par central. Dizia o padre, que era uma festa muito profana!
Revista a visão daquele padre retrógrado, a festa retornou, com todo o seu vigor na década de 1980, sendo a Imperatriz Terezinha Alvarenga e o Imperador Leandro Raposo, mas uma festa bem diferente das anteriores.
Importante evento turístico cultural, merece mais atenção dos interessados nessas áreas.

Festeiros da Festa do Divino Espírito Santo

Manoel Antunes Moreira – Eleito, 1775
O mesmo – Sorteado 1776
Francisco Franco Peniche 1777 e 1778
Amaro da Silva Moreira – o pai 1779
Capitão Pedro Álvares, 1780
Capitão Manuel Antunes Moreira, 1781
Manoel de São Jose,1782
Domingos Francisco Gaya, 1783
Francisco Ignácio, 1784
Manoel Freire de Andrade, 1785
Antonio Nunes, 1786
Capitão Jose Gonçalves da Silva, 1787
Francisco Antonio, 1788
Salvador Martins da Costa, 1789
Capitão Manoel Antunes Moreira, 1790
Francisco Luiz de Andrade, 1791
Salvador Franco da Mota, 1792
Alexandre Rosa, Perla Cintra e Carolina
 Lobato no altar do "Divino Espírito Santo".
1984
João Rodrigues das Neves, 1793
Amaro da Silva Moreira – o filho, por promessa 1794
Pedro Aranha, 1795
Gregório Barreto de Souza, 1796
Padre Manoel Gomes de Azevedo, 1797
Manoel Pereira de Atahyde, 1798
João de Oliveira de Andrade, 1799
João Martins da Mota, 1800
Manoel Freire de Andrade, 1801
Jose Ayres de Atahyde, 1802
Salvador Franco da Mota, 1803
Antonio Pinto Neto, 1804
João Martins da Silva Coutinho, 1805
Francisco Luiz de Andrade, 1806
João Martins da Mota, 1807
Alferes Jose Alves Rangel, 1808
Domingos Jose Machado Coelho, 1809
Alferes Domingos Alves de Barcelos, 1810
Jose Caetano de Oliveira, 1811
Capitão Manoel da Silva Moreira, não festejou em 1812, mas em 1813
Martinho Gomes leal, 1814
Antonio Gomes de Andrade,  não festejou 1815, mas 1816.
Antonio Lopes Ramos, 1817
João pereira dos Santos, 1818
Francisco Jose Rodrigues Fernandes, 1819
João da Silva Barreto, 1820
Joaquim Jose de Freitas, 1821
Tenente Joaquim de Souza Freitas, 1822
Capitão Manoel Manhães Barreto, por seu filho 1823
Vigário Manoel Gomes de Azevedo, 1824
Joaquim Ferreira, 1825
Amaro da Silva Moreira, 1826
Jose Rodrigues de Freitas, 1827
Capitão Antonio da Silva Cordeiro, 1828
Vig. Manoel Gomes de Azevedo, 1829
Thomaz Joaquim de Farias, 1830
Capitão Manoel da Silva Moreira, 1831
Jose Rodrigues de Faria, não festejou nem 32, nem 33, pela Matriz Fechada.
Manoel Gomes Moreira, 1834
Joaquim de Souza Pinto, 1835
João Ennes Viana, 1836
Jose Antonio de Souza Filho, 1837
Alferes Jose Alves Rangel, 1838
Estes homens públicos realizavam essas festas, para terem seus nomes lembrados pelos contemporâneos.

Estella e Wlamir Lobato, prontos para a festa.
1964
Curiosidades da Festa do Divino

Em 1784, o festeiro Francisco Ignácio, de posse do cetro e da coroa, julgando-se autoridade constituída, saiu pela Vila para implantar a ordem; acabando com festejos noturnos, algazarras de marinheiros ou o que parecia suspeito.
Junto com seu pajem de estoque e alguns mordomos, todos armados, saiu para acabar com um fandango na casa duma meretriz muito afamada.  Lá, após dar ordem de fechar o recinto, foi indagado, por um dos folgazões, sobre de onde vinha a ordem.
Foi o bastante para o “pau quebrar” quando anunciaram que a ordem vinha do “Imperador do Divino”. As coisas se inverteram e os marinheiros, em maior número, colocaram para correr o séquito do imperador.

Em 1792 saiu festeiro Salvador Franco da Mota, que por não estar na Vila na ocasião, foi representado por Manoel Gomes de Azevedo, que na volta do Mota, não quis devolver a coroa e festejou por sua conta.

No principio a festa era promovida pelo Imperador com seus mordomos, que aos domingos da Ressurreição até Pentecostes, iam  da casa daquele até a igreja cantando e dançando a frente de uma folia. Nos dias principais, almoços, jantares , leilões de prendas e danças animavam o lugar.

Os instituidores da festa foram os açorianos Francisco Antonio,  Jose dos Ramos, João Rodrigues, que nos festejos tocava tambor, e um de apelido “Baralha”.

NOVOS IMPERADORES E IMPERATRIZES

Nair Almeida, João Batista, Estella Lobato e Nelson Patricio Delphim
Pereira em 1964 na festa organizada por João Francisco de Almeida.

Relação das Imperatrizes e dos Imperadores, no ano em que foram escolhidos para festejarem o Divino Espírito Santo, já no século XX.

1983- Terezinha Alvarenga e Leandro Raposo
1984- Leila Bomgosto e Luciano Almeida
1985- Perla Cintra e Alexandre Rosa
1986- Regina Soares e Manoel Pinto
1987- Gilberta Miranda e Jomar Serra
1988- Jane Graça e Marcos dos Santos
1989- Flavia C. e Leandro Sena Penha
Estella e Agenor Lobato indo para o cortejo
em 1964.
1990- Milena e Wladymir Ferreira
1991- Cristiane Malhardes e Igor Cardoso
1992- Lidiane Sena e Marcio Barbosa
1993- Milleane Sena e Willian Barbosa
1994- Emanuele Gaia e Marcio
1995- Diana Cintra e Diego Gaia
1996-  idem
1997- Luzinete Almeida e Rodrigo Cunha
1998- Monica e Glauber  dos Santos
1999- Chaiane e João Felipe Amaral
2000- Thais e Lucas Sena
2001-  Idem
2002- Samiê e Daniel Cunha
2003- Ana Paula e Guinther Mattos
2004- Enanda e Matheus Roberto
2005- Stephany e Hiago Gaia
2006- Sara e Iam Machado
2007- Larissa e Rafael Silva
2008- Karla e Gabriel Motta
2009- Lara e Zulício Novas
2010- Lorrayne e João Victor
2011- Maria Fernanda e Gabriel
2012- Anna Carolina e Luiz Fellipe Serra

quarta-feira, 9 de maio de 2012

DUELO LITERÁRIO


Quem conhece São João da Barra a mais de dois anos, já ouviu, alguma vez, as famosas marchas carnavalescas :

“Ouvi uma gargalhada lá do alto do oriente
Quá, quá, quá quá quá quá, mas deve ser essa gente,
Essa gente que vive a magoar...”

- e do outro lado:

“A gargalhada que vocês ouviram,
Aqui do alto do oriente,
Ela não foi forçada,
Foi a vitoria de nossa gente...”

Essas marchas rancho, a primeira dos Congos e a resposta do Chinês, são o mais popular exemplo de uma prática literária sanjoanense muito antiga.
A tradição costuma opor literatos, cultos ou populares, em campos opostos dos vários partidos  políticos, carnavalescos, ou simplesmente jornalísticos para com penas afiadíssimas  se digladiarem ou através das paginas dos semanários, nos famosos Bandos Juninos ou até mesmo nas cantigas de carnaval.
Misturar carnaval com política sempre foi mister do nosso povo. São famosas as críticas carnavalescas de costumes.
Mas o que pretendo contar é a historia do Dr. Fernando Pinheiro e seu jornal “A Evolução” com o professor Aluizio Faria do outro lado em “O Libertador” antagônico jornais políticos da época.
A historia eu soube por João Oscar , quem diz que: “...o desentendimento entre os redatores políticos dos dois jornais era por demais conhecido de todos. Ambos usavam e abusavam da troca de ofensas e palavras ásperas(...) Aluizio Faria, imprudente e mordaz, dizia gatos e lagartos do venerando clínico, mas cessou de dizê-lo quando, em 3 de setembro de 1950, inopinadamente, “A Evolução” publicou o seguinte soneto:

                       PERFIL DE QUASÍMODO

                 Soneto de autor ignorado, publicado, há tempos, na imprensa de Campos, dedicado ao Prof. A.Faria,

Horrendo, qual pintor em tela fina
Debuxar jamais pode ou nunca ousara;
Horrendo qual jamais desabrochara
Algum caso sem par na medicina.

Horrendo, qual se a própria mão ferina
Do diabo lhe animara a forma rara;
Horrendo como alguém que pôs a cara
Em conserva no fosso da latrina;

Horrendo, qual alguém que por acaso
Tenha chegado ao mundo a muito custo,
Ou tenha, então, nascido com atraso...

Digo-te aqui, ó professor, em segredo:
Quem pode ver-te sem morrer de susto?
Quem pode olhar-te sem morrer de medo?...

E João Oscar continua “...tratava-se, evidentemente, de parodia de um soneto famoso. Mas foi tão grande a repercussão desse fato na alma de Aluisio Faria, que anos mais tarde, em sua residência, nas proximidades do Fórum Sanjoanense, ele me confidenciou – Jamais me aborreci tanto em minha vida.”
Tempos depois, comentando o fato com Moema Magalhães, ela me disse que havia um zum, zum, zum, na sua casa de que teria sido, seu pai Dr. Newton Alves, excelente poeta, e não Dr. Fernando, excelente clínico, o autor da paródia. Ela não afirmou, mas deixou a dúvida no ar.
A alguns dias encontrei em meu acervo um número do jornal “Primeiro de Março” de  07 de dezembro de 1871, em que publicou-se o seguinte soneto:

A UMA CELEBRIDADE ARTISTICA

Formosa, qual pincel em tela fina
Debuxar jamais pode; ou nunca ousara,
Formosa, qual aos céus jamais brilhara,
Astro gentil, estrela matutina!

Formosa, qual se a própria mão divina
Lhe alinhara o contorno, a forma rara,
Formosa, qual jamais desabrochara,
Na primavera a rosa purpurina.

Formosa em fim, qual natureza e arte,
Dando as mãos em seus dons, em seus louvores,
Jamais pode imitar em qualquer parte!

Mulher Celeste! Oh! Anjo de Primores!
Quem pode ver-te, sem querer amar-te,
Quem pode amar-te, sem morrer de amores?
                     Maciel Monteiro.
Se foi Dr. Newton ou Dr. Fernando, penso que jamais saberemos, mas contudo, o habito dos duelos literários, tão ao gosto nordestino, foi espontâneo na nossa cultura e temos outros exemplos que ficam para outra ocasião.

                                                         
Fernando Antonio Lobato