segunda-feira, 23 de abril de 2012

Malhação de Judas


Para Carlos Alberto Oliveira:

No sábado passado, na praça de São Benedito, reuniram-se alguns membros do grupo “Nós na Rua”, para repetir uma tradição centenária que o grupo resgatou. A Malhação de Judas.
Para os mais novos devo contar e aos mais velhos relembrar, o que vem a ser a tal da “Malhação de Judas” no sábado de Aleluia. Os Evangelhos nos contam a história dos últimos dias do Cristo na terra, o contato com seus apóstolos e a traição de um deles, de nome Judas, que por trinta dinheiros entregou-o aos Sacerdotes do Templo. A tradição Cristã passou então a não perdoar, contrariando o próprio Cristo, o traidor e, dele passou a se vingar todos os anos, reencenado o enforcamento do infeliz apóstolo.
Tradição Cristã européia, como outras, transplantada pelos portugueses para a colônia brasileira. É de Debret, uma das mais antigas imagens desta tradição que se espalhou pelas ruas das cidades de costa a costa. E explica o pintor do que se trata: “...a parte superior da cena mostra elementos pobres armando o Judas de palha com roupa de homem a que se acrescentou uma máscara com um boné de lã para formar a cabeça; algumas bombas colocadas nas coxas, nos braços e na cabeça serviam para deslocar o boneco no momento oportuno e uma arvore nova fazia as vezes de uma forca. Esses preparativos eram feitos durante a noite, afim de estar tudo pronto pela manhã. O Judas é suspenso pelo pescoço e segura uma bolsa suposta cheia de dinheiro; tem no peito um cartaz quase sempre concebido nestes termos: Eis o retrato de um miserável, supliciado por ter abandonado seu pais e traído seu senhor.”
Aqui em São João da Barra, a tradição é muito antiga, centenária mesmo. Enforca-se  o infeliz que ficou pendurado a noite inteira e depois queimam-lhes as roupas, ate que o boneco começa a despencar quando a criançada inicia a pancadaria. Em  pequeno me lembro de nós sairmos cada um com um pedaço de pau, correndo e batendo nos restos do boneco flamejante que algum marmanjo laçava e saia arrastando montado em uma bicicleta.
Papai já malhava o Judas e antes dele meu avô. Tive a sorte de encontrar uns versos, escritos por Dona Cocota Simões, para uma malhação de Judas feita pelo seu neto Carlos Alberto com o amigo Odyr, meu pai.
 Para quem não conheceu Dona Cocota Simões, ou melhor, Dona Maria das Dores Pavão Simões era uma das mais importantes damas de nossa sociedade, matriarca de preclara família...Mas, as mulheres daqui, mesmo as mais recatadas e importantes, viviam próximo do porto... e no porto, você sabe... portanto não se espantem com a irreverência dos versos, pois sempre foram próprias das mais distintas damas daqui da cidade. Divirtam-se como eu me diverti ao lê-los.
Por outro lado, a malhação do Nós na Rua, vem aos poucos adquirindo o prestigio e a tradição que tinham perdido. As crianças presentes adoram e a cultura do lugar se enriquece com esses hábitos ancestrais, cheios de sabor e poesia, coisas de cidade antiga.
Trouxe os versos de D. Cocota para que todos possam rir.
Lembrança de 31 de março de 1945 em um sábado de Aleluia. Um judeu feito por Senhora, minha filha e o meu neto Carlos Alberto. Fazendo Judas o seu testamento

TESTAMENTO DO JUDAS


Eu Judas Escariotis
Sentindo um pesar profundo
Vou fazer meu testamento,
Porque vou deixar o mundo.

Para D. Nair que eu tenho
Grande consideração
Deixo como uma lembrança,
O meu pobre coração.

E para D. Lindoca
Deixo meu dolmam sebento
Para vestir no noivo
No dia do casamento.

Para Donita que é
Minha amiga verdadeira,
Deixo um culote rasgado 
E um bom par de perneiras.

Para D. Cocota eu deixo
Para que todo mundo veja,
Um livro e um rosário
Para rezar na igreja.

E para D. Senhora,
Esquecer a viuvez
Deixo a minha aliança
Para casar outra vez.

Para Antonio Curumba
Como prova de amizade,
Deixo uma franguinha,
Para passear na cidade.

Para D. Nilda Oliveira
Em que tenho muita fé,
Deixo para os dias de chuva,
O meu bonito boné.


Para D. Nelly
Como sou casamenteiro
Deixo para o enxoval
O meu saco de dinheiro.

E para Carlos Alberto,
Porque tem muita vergonha
Deixo como lembrança
Minha cara de cegonha.

E para Odyr Labonde
Por ser muito espevitado,
Deixo como lembrança
Os meus sapatos rasgados

Para Beldo Macedo
Deixo com minha cinura
Meia dúzia dos meus dentes
Para fazer uma dentadura.

Para Sinhozinho Valle
Peço que ninguém se meta,
Deixo como lembrança
Uma gravata borboleta.

Para Mariana Mello
Que tem um gosto esquisito
Como uma lembrança
Eu deixo o meu pirulito

Para minha amiga Edith
De quem vou me despedir
Deixo o meu par de ovos
Para ela se divertir.

E já tendo dado tudo
Ficando com o corpo nu,
Como prova de amizade,
Deixo para Aninha Bongosto o meu cú.

Como despedida do mundo

A Catarina Lamego
Eu deixo saudades infindas
De todo o nosso chamego.
  Fim.












Fernando Antônio Lobato

O CENTENARIO DO CONHAQUE DE ALCATRÃO


Muito se falou e muito irá se falar por ocasião do centenário da Industria de Bebidas Joaquim Thomaz de Aquino filho, produtora do Conhaque de Alcatrão de São João da Barra, primitivamente chamado de Cognac de Alcatrão da Noruega. Mas as nossas homenagens irão diferir das demais por lançar luz sobre a mulher responsável por este centenário empreendimento fabril.
MARIA JULIA AQUINO, nascida Maria Julia Lobato Neves, filha do Capitão Jose Lobato Neves e D.Julia Cruz de Oliveira, neta materna do rico Major Manoel Antonio Oliveira Cruz, um dos quatro sócios majoritários fundador da Companhia de Navegação São João da Barra Campos e sócio do Barão de Barcelos na Usina de mesmo nome.
Nasceu em São João da Barra em 25/08/1888 casou-se na matriz de São João Batista em 1903 com Joaquim Thomaz de Aquino Filho, filho de D. Carolina Sá e Tenente Joaquim Thomaz de Aquino. Tiveram 23 filhos e um adotivo.
Tendo saído da casa paterna para se casar, o inicio da vida de Maria Julia foi muito difícil, criada com luxo e conforto, teve que assumir não só a administração da casa como auxiliar o marido no “Café Central” anexo à casa de residência. Não faltam registros dos sanjoanenses da época que testemunharam-na tocando com as próprias forças a moenda do caldo de cana existente no estabelecimento. Mulher de fibra e têmpera criou com amor e pulso os diversos filhos, segundo contam não atravessava o batente da porta do quarto sem estar grávida e neste estado viveu quase que toda a sua vida, sem que com isso tivesse deixado um momento sequer de auxiliar no empreendimento familiar.
Foi nos testemunhos dos conterrâneos da guerreira matriarca que fomos buscar ainda a informação da importância desta mulher no processo de fundação deste centenário estabelecimento. Pois segundo consta, foi na sua cozinha onde se prepararam os primeiros frascos do poderoso Cognac da Noruega. Foram nas suas panelas que se misturaram os primeiros ingredientes do miraculoso cognac muito recomendado para quem sofria de tosse e problemas pulmonares.
Conterrânea de outra grande mulher, a poetisa Narcisa Amália, Maria Julia embora tendo falecido relativamente jovem em 02/ 05/1939 aos 51 anos, deixou junto com seu marido, um legado não só para sua família, mas para toda a cidade de São João da Barra, uma vez que com o desenvolvimento dessa industria iniciada de forma caseira em sua cozinha, e com o declínio econômico do porto a cidade encontrou uma forma de minimizar o impacto do baque econômico que sofreu.
No período mais critico da economia de São João da Barra, que vai de 1918 com o fechamento da companhia de navegação até o inicio dos anos 80 com a descoberta do petróleo em nossa região, foi a Industria de Bebidas que alimentou muitos sanjoanenses e era o apito desta mesma fabrica o norteador da sociedade sanjoanense. Ainda hoje quando novos horizontes descortinam-se na cidade, é ainda a Centenária industria um ponto de referencia e orgulho para nossa gente. Hoje totalmente remodelada e modernizada, caminhando para a quarta geração da família, é orgulho de nossa cidade que engalanada festeja tão venturoso centenário. As mulheres de São João da Barra, nobres descendentes das índias Goytacazes,  Olham para nossa historia e se orgulham de ter em nosso panteão uma heroína do quilate de Maria Júlia. E através dela homenageamos e agradecemos todos os seus descendentes.

P.S. Este texto foi escrito em 2008 por ocasião do centenário da Industria Sanjoanense.

quinta-feira, 12 de abril de 2012

O CARNAVAL SANJOANENSE


 O Carnaval no Brasil tem inicio como uma festa da igreja, ligada as liturgias da Páscoa e sua Quaresma. As primeira noticias que temos do evento nos falam do “entrudo” ( do latim “intróito”, entrada) trazido do velho mundo pelos portugueses das Ilhas dos Açores por volta de 1720. Nos dias dedicados às festas carnavalescas o povo se divertia jogando água e farinha uns nos outros em flagrante subversão da ordem, quando os plebeus podiam se misturar aos nobres e estes passarem-se por gente do povo. Momento em que todos se igualavam.
   Já em janeiro de 1840, foi realizado no Rio de Janeiro o que se pode ser chamado de Primeiro Baile de Carnaval, quando uma loja carioca importou um grande estoque de mascaras, barbas e bigodes postiços usados naquele evento, que logo tornou-se moda espalhando a novidade por outros rincões. Mais tarde em 1852, também naquela capital surgiu o “Zé Pereira” – conjunto de bumbo e tambores, tendo à frente o sapateiro Jose Nogueira de Azevedo Paredes. Ambos eventos copiados e reproduzidos aqui pelos sanjoanense logo nos anos seguintes.
   Os primeiros clubes Carnavalescos surgiram em 1855, dando inicio ao carnaval de moldes europeus com mascarados pelas ruas, blocos, cordões e ranchos com suas cantigas e marchas acompanhados de instrumentos como rabecas, cuícas, pandeiros, tambores e tamborins. Aqui em São João da Barra podemos citar “Os Príncipes de Avernos” , “Os Filhos de Averno” , “Os Conchas”, “Os Caçadores” “Saldanhas”.
   O Jornal “O Paraibano” de 07/02/1868, trouxe em sua pagina de propagandas o seguinte anuncio: “ Para o Entrudo – Cera em pão, Verdete, óleo essencial de alfazema. Vende-se na casa do Moraes”. Já no mesmo jornal do dia 21/02/1868 outra propaganda “ Para o Carnaval - Chegou um Sortimento de lindas Mascaras de todas as qualidades, para a Casa do Moraes”. E ainda no mesmo jornal o seguinte comunicado “ Carnaval – A Sociedade União Carnavalesca, faz ciente ao respeitável publico desta cidade, que pretende dar um baile, no domingo 23 do corrente, e como os elegantes mascaras tem de sair a tarde em passeio, para percorrer as ruas, por isso pede por especial obséquio as pessoas prediletas do entrudo, para não as molharem. Eugenio Gomes de Azevedo Bath”, outro anuncio já diz: “O Diogo, vende para as damas do carnaval, enfeites o mais barato possível”  Essas são as mais antigas citações escritas dessa nossa grande festa no século XIX.
   A cidade vivia seu apogeu naquela época e isso fez com que tais associações adquirissem um gigantismo cada vez crescente. Em fins do XIX surgem suas duas maiores agremiações voltadas para o carnaval  O Clube União dos Operários e a Lira Democrata, cada qual buscando primor, beleza e arte em seus desfiles magníficos guardados na memória dos que viveram aqueles momentos. Essas instituições romperam o século e continuaram a brilhar no carnaval até o fim do período portuário fenecendo finalmente no carnaval de 1913 de saudosa memória.
   O período da decadência fez surgirem “As Magnólias” “As Sempre-Vivas” e depois, Marujos, Indianos, novamente  “Conchas e Caçadores” e finalmente Congos e Chinês, surgidos na década de 1930 como blocos de Rancho com suas Alas, seus Balizas e Porta- Estandartes, seus Mestres Cantos munidos dos respectivos apitos, marcando o inicio das evoluções e seus magníficos carros alegóricos puxados por burricos. Esses Ranchos atravessaram o século XX transformando-se em escolas de Samba ao fim da década de 70.
Quanto ao carnaval de rua, o que no princípio era o entrudo foi se transformando, principalmente depois da Família Real chegar ao Brasil, quando a tradição já centenária foi abolida do carnaval. Chegam os mascarados europeus e com eles uma nova maneira de se divertir no período anterior a Quaresma Pascal. Com estes máscaras, chegam à nossa cidade os luxuosos “Dominós” que, segundo pesquisa realizada nos anos 80 por Moema Magalhães, “ ...são personagens oriundos da inquisição medieval, os Dominicanos ( em latim,  Domini = Senhor, Canis = Cães ) ou seja, os Cães do Senhor, os guardiões da Fé, os Carrascos da heresias que com seus mantos negros e rostos cobertos, executavam suas vítimas. Com o fim da Inquisição estes personagem foram introduzidos no carnaval de Veneza e de lá chegaram  para nós através de nosso porto cosmopolita. Com suas túnicas, capas, capuzes, mascaras e seus inseparáveis corta-vozes animam ainda hoje as ruas da cidade. Na década de 80 por sugestão do Dr. Ailton Damas, o Jornal “Folha Nova” de Adméa Lobato criou o Concurso de Dominós a fim de premiar este personagem da nossa rica cultura.
Nosso Carnaval , lindo até os dias de hoje, deve muita a Eugenio Bath, Belmiro Fluminense, Mariquinha Salva, Joaquim da Câmara  Pavão, Jose Henrique e seu filho Coriolano, Amando Alves, seu filho Newton Alves, sua neta Moema Magalhães. Deve muito a Quinca de Bisa, a Tuiú e Perna, deve ainda a Heloina Pinto e suas irmãs, a Gecila Gaia e sua família, a Ditinho Campista, Dilsinho e Delinho Peixoto, as Almeida ( Todas) enfim ao sanjoanense que de um modo geral vive o ano inteiro para os três dias de Carnaval.
Alegoria do Clube Carnavalesco dos Democratas no memorável carnaval de 1913. Uma homenagem à  Câmara municipal.

Alegoria do Clube Democrata nos fundos da Igreja Matriz no carnaval de 1913. A frente , a cavalo, o Coronel Amando Alves, líder político e maioral daquela agremiação carnavalesca.

Alegoria carnavalesca criada por Coriolano Henriques para "Os Democratas" no carnaval de 1913. Ao fundo vemos a lateral da Igreja Matriz e a casa de Cleuza Azevedo. Observe os burricos atrelados ao carro.

Fernando Antonio Lobato

terça-feira, 10 de abril de 2012

A PRIMEIRA TABELIÃ DO BRASIL


Conheci Vovó Mocinha já bem velhinha, uma incongruência talvez, mas o fato e que conheci a avó de mamãe já cega e quase sempre sentada em uma cadeira de balanço no quarto em frente a sala de jantar de sua casa na rua Direita. A casa ficava  quase em frente a praça, onde moravam as pessoas importantes da cidade. E vovó Mocinha, era uma pessoa muito importante na cidade. Mamãe dizia que ela havia sido nomeada a Primeira Mulher Tabeliã do Brasil. Havia uma placa de prata em cima do móvel da sala de estar do velho solar, que confirmava este fato. Um dia me disseram que ela seria até Condessa, mas eu descobri logo que isso era mentira.
Mas Vovó - na realidade Irene de Souza Lobato era minha bisavó, era mesmo uma pessoa importante por aqui. Ela herdou o Cartório do Primeiro Oficio de seu pai João de Souza, naquela época os cartórios eram hereditários e o nosso já estava na família desde o pai de Caá, esposa de João de Souza, o Coronel Francisco Ferreira Pinto que vindo de Nictheroy aqui se casou com minha Quarta Avó Catharina de Sena. Voltando a Vovó Mocinha, herdando o cartório ela foi nomeada pelo Governo Federal, pois as nomeações eram federais, e passou a ser a Primeira Mulher no país a ocupar tal cargo.
Vovó nasceu aqui mesmo em São João da Barra em 25 de abril de 1890, filha de João Batista de Souza Salermo e Carolina Sena de Oliveira Pinto, estudou na Escola Mista e era componente do Coral da Matriz, do qual faziam parte Carmem Martins Coutinho, Carlotinha Machado, Lucia Cruz, Carola Braga, Estelita Zacarias, Laudelina, Antunica Cezar, Luzia Jorge, Mocinha Madalena, Manoel Braga e Álvaro de Oliveira. Casou-se em 1908 com Jorge Lobato de Oliveira com quem teve três filhos Antenor, Joaquim e Dalila. Logo ficou viúva quando Jorge faleceu, vitima de uma tuberculose em 18/12/1913, voltando para a casa paterna com seus três filhos pequenos.
Após o falecimento de seu pai João de Souza, foi nomeada para assumir o cartório da família. Em 1928 casou-se a segunda vez com Ermelindo Coelho nascendo o quarto Filho João Antonio em 07 de julho de 1930.
Segundo mamãe, vovó era excelente cozinheira e em sua mesa havia sempre uma fartura exagerada de alimentos com ensopados, assados para quem não comia ensopado, peixe para quem não comia assado, frango para quem não comia peixe, tortas, sopas e doces em profusão. Devotadíssima de São Benedito vinha sempre aos domingos acender velas para seus antepassados falecidos, me lembro dela acompanhada sempre de tia Detinha e de Ely. Ainda segundo mamãe, vovó adorava um “movimento” e quando morava no Campo do Suco, numa casa que fazia fundos com a rua Direita, ela se mudava por ocasião da festa de São João para a casa da praça. Eram trouxas de roupas, caixas com mantimentos, roupas de cama, bacias, panelas e todo trem de cozinha que ela despachava em várias carroças, retornando tudo depois do evento. Para depois fazer tudo de novo no carnaval e rumo a Atafona na festa de N.Senhora da Penha quando ela se alojava com sua entourage na casinha de fronte para a igreja e fundo para o farol, entre pitangueira e guriris.
Uma mulher moderna para os padrões de sua época, criou seus filhos e os netos Jorge, Ely e Georgina, filhos de seu filho Quincas. A última lembrança que tenho dela foi um passeio que fizemos de caminhonete às suas terras em Buena, uma fazenda linda que se quedava no mar com pedregulhos e mariscos, onde passamos um dia inteiro entre brincadeiras mis. Depois ela foi para o hospital e ficou até morrer na véspera do Natal, no dia 24 de dezembro de 1972.
Tenho saudades da varanda da casa dela, de chegarmos para as festas e passarmos no quarto para tomar-lhe a benção. Aquela veneranda criatura, que nos enchia de orgulho por dela descendermos. Vovó Mocinha, uma sanjoanense das primeiras e cujo nome hoje é sempre lembrado quando passa o carro do gás anunciando seu endereço em Atafona à rua Irene de Souza Lobato próximo ao Arahujo Material de Construção.

Fotografia dos alunos da Escola Mista Municipal na virada do século. Tendo à frente a menina Irene Sena segurando a placa de identificação. Ao fundo a professora que ainda estamos tentando descobrir quem era.

Fernando Antonio Lobato

domingo, 1 de abril de 2012

O palácio dos Lizandro dos Santos


Era um verão dos anos 80, não me lembro qual; daqueles que faziam Atafona trepidar,quando aquela praia era referencial nos quesitos sofisticação, elegância, animação. As festas se sucediam: réveillon com Ana Márcia e Zé Lizandro, aniversário de Marília Aquino, almoços com Soninha Ferreira (a Banda do Peru), a boate Boga, serenatas nas varandas, gincanas no praia clube e etc., etc.
    Naquela noite, havia um jantar em homenagem a Carlos e Moema Magalhães oferecido por Ailton e Nidia Lizandro dos Santos no rico palácio de verão dos usineiros campistas na praia sanjoanense. Os filhos de ambos, Maria Eugenia e Luiz Carlos haviam acabado de casar.
    O Jantar, foi o que se pode imaginar de mais sofisticado e além das iguarias que não me ficaram na memória mas, sei, eram inigualáveis; o que mais chamava a atenção era a deslumbrante toalha de linho bordada, sobre a mesa enorme: éramos 18 sentados; e os talheres de prata com cabo de chifre de veado. Alias, a conversa inicial do jantar foi sobre os talheres comprados em Londres e presenteados a anfitriã pelo filho Francisco, a época já falecido. Com o faqueiro sendo depois ampliado por ela em viagem aquela capital européia.
A casa em questão, hoje só restam escombros, era a maior e melhor residência daquela praia. Cercada por altos muros de cor ocre, tinha a toda volta um verdejante jardim com coqueiros, bromélias e plantas exóticas. Com  alto e imponente pé direito, tinha por cima da grossa laje um charmoso telhado colonial.
    O acesso se fazia por um grande portão de madeira que se abriam para uma calçada de granito até a magnífica porta de entrada. Um elegante vestíbulo decorado com requinte e personalidade era o primeiro cômodo de onde se acessavam varias salas e saletas decoradas com motivos náuticos. Em seguida a imensa sala de jantar com um grande lustre chamado a atenção do ambiente. Os moveis e objetos denotavam o seu alto valor. Daí seguia-se para as áreas de serviço e a parte intima com as suas várias suítes e quartos para os donos e seus hospedes.
    No fundo a edícula com compartimentos de muitos empregados e as garagens com espaço para vários carros
    Construído sobre sólida estrutura de ferro e concreto o casarão foi plantado na dunas da praia com alicerces tão profundos que ultrapassavam 5 metros e sob a casa foi feito um subterrâneo com dependências de empregados.
    Alguns anos depois a areia invadiu a rua, tomou o muro acabando por destruí-lo e invadir a casa. O mar avançado em cada maré foi corroendo-a por baixo ao ponto de deixá-la com a metade suspensa partindo-se em duas como o “Titanic” e naufragando no mar.
Hoje resta a lembrança de uma época em que Atafona era a rainha do litoral e todos que importavam aqui vinham reverenciá-la.
PS Eu, como amigo de Carlos e Moema, tive o prazer do convite para esse jantar.
Nidia Lizandro com suas filhas Aspazia e Maria Eugenia na casa atafonense
  Fernando Antonio Lobato